Meu Deus, eu também sou ridículo! - Eider Queiroz

Em determinado momento do ano passado minha amiga ficou ficcionada com Maria Bethânia recitando o poema “Todas As Cartas de Amor São”, de Fernando Pessoa. Era todo dia pelo menos 5 recitais desse texto, e eu sempre achei cômico, era a piada pela piada entre nós. 

A verdade é que eu nunca tinha entendido a caricatice do amar. Eu nunca tive no meu repertório pessoal o brilho da reciprocidade, por um curto momento no ano passado pensei que talvez aconteceria, me enganei. Tratei o amor romântico como o objeto de desejo que nunca poderia ter, fútil, simplório, esquecível. Nas palavras eu dizia assim, mas no meu íntimo eu só sabia sentir a raiva com relação ao que passei e há quem me fez passar pelo trauma. 

Tive também tanta tanta tanta raiva de mim, afinal como assim eu poderia ter caído no conto do vigário, acreditar no conto de fadas dentro da minha vida e torcer por mim? Nunca que eu poderia ter sido delirante de tal forma porque os outros não poderiam saber que também sou vulnerável, solitário e bobo. Eu não podia ser ridículo. “Eider, você não é bobo por isso.” meu psicólogo dizia toda vez que eu revisitava esse sentimento durante as sessões.

 Mas como eu poderia acreditar em outra coisa se ser amado nunca foi uma das minhas fantasias. Logo eu que me descrevo como lúdico e sonho, crio, invento. Mas sempre foi para os outros que eu sonhei, criei, inventei o romance, nas diversas histórias fictícias que já escrevi ou na vida das minhas amigas me diverti pincelando utopias disfuncionais, realidades alternativas totalmente possíveis. Dedicar meu tempo para fazer o mesmo para mim seria cair em delírio em praça pública.

 Até o dia que eu escrevi em cor-de-rosa nas páginas do meu diário uma cena de amor com o mesmo menino, o Sr.Quase Recíproco. Naquela noite saiu de mim a maior parte das correntes que me sufocavam, eu me permiti ser ridículo. Tem uma canção da Katy Perry que se chama Tucked onde ela diz:

“Eu poderia nos colocar em uma ilha 
Eu poderia nos colocar em uma mansão 
Eu poderia nos colocar em um banco de trás, sim 
Você está em qualquer lugar que eu quero que você esteja 
 Eu mantenho você escondido dentro da minha cabeça 
Onde eu posso te encontrar a hora que eu quiser” 

Segui as palavras da minha diva e no espaço físico mais íntimo meu, as páginas do meu diário, escritas no meu quarto, imaginei um nós falando sobre ele em canções e utopia. Só Deus e meu psicólogo sabem o tanto que fui ridículo com aquelas palavras, mas também o tanto que eu fui eu. Não fiz uma carta de amor, ainda chegou a minha hora. Mas para esse garoto, para a versão dele que eu criei para mim, fiz uma playlist “Tome essa playlist como a minha grande carta de amor” e ela não poderia começar de outra maneira.


> Esse texto é uma faz parte do lançamento do "Histórias não tão minhas", que convida outros escritores, amigos e colaboradores a contarem suas histórias.

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