Qual é o limiar da saudade?


 "Você sabe 

Sempre critiquei quem só fala de saudade

Mas eu tô com tanta saudade" [DDGA, Rico Dalasam]

Eu não consigo dizer com exatidão quando foi que escutei esse verso pela primeira vez mas algo eu tenho certeza, eu sentia muitas saudades da pessoa que me enviou esse disco. E foi assim por um bom tempo, bom tempo escutando os versos do Rico e lembrando dessa pessoa.

Alguns anos já se passaram e para ironia do destino essa pessoa recentemente apareceu numa sexta qualquer me questionando sobre meu afastamento repetindo após algumas diversas tentativas conjuntas de se estabelecer algo além do sentimento romântico que acredito que nutri sozinho nessa relação. Algo que acho que nunca conseguimos e nem conseguiríamos mas conhecidamente com seu reaparecimento esse verso do Rico reapareceu com mais força na minha vida.

Hoje vivo a base de saudades e como o próprio Dalassam fala "sempre critiquei quem só fala de saudade" e de fato eu só falo de saudade "mas eu tô com tanta saudade" que nem sabia que podia sentir algo assim por alguém que somente está longe fisicamente de mim. Estou a meses num relacionamento a distância e tendo que diariamente me contentar com longas chamadas de vídeo para nos mantermos dentro da vida um do outro.

O que apareceu fortemente essa semana foi o questionamento de "Como é possível sentir tanta saudades de uma pessoa?" e mais cedo ainda, "Como posso sentir tudo isso?".

Como dito anteriormente, sempre tive muita distância envolvida nos meus relacionamentos, desde meu nascimento até os meus amorosos. Nem que a quilometragem se resumisse aos 100km entre mim e minha cidade natal, ainda assim, distante. Estabelecer os limites da  saudade sempre esteve atrelado ao feriado mais próximo no calendário.

Se são as férias escolares de junho, São João na casa dos meus avós maternos, já o natal, que tal mais ao sul do estado para estar com minha avó e familiares paternos. A saudade tinha prazo para ser vencida, prazo para ser matada por alguns dias mergulhado em todas as novidades adquiridas durante a distância, ou seja, a saudade sempre foi algo que poderia ser estagnada, até.

Levei meses para retornar a casa dos meus avós maternos depois que meu avô faleceu, a distância me fez achar que ao chegar naquela casa eu poderia correr até o quintal e encontra-lo em alguma atividade do seu cotidiano. Abrir aquela pequena porta que separava seu quintal do resto da casa e não encontra-lo foi estranho. Eu tinha uma data, eu tinha chegado lá no momento combinado, o que eu faria com toda aquela saudade?

Percebi que existia um tipo distância que eu não poderia encurtar, uma saudade que não poderia sanar, já se foram 10 anos e mais algumas distâncias que não posso encurtar e outras saudades que não posso sanar que apareceram no meu caminho. Na terapia trato essa saudade como luto, dói menos hoje do que a 4 anos quando entrei nessa de mergulhar na minha cabeça para tentar organizar tudo aqui dentro.

Eu estava com meu namorado, naquele momento nada mais do que um homem que conhecia presencialmente a pouco menos de 72h, quando eu senti o aperto da despedida pela primeira vez. Foi diferente de o deixar no apartamento ao amanhecer, dessa vez ele que me deixava para seguir algum caminho desconhecido por mim.

As horas subsequentes foram torturantes, sentimento que acabou com nosso encontro ao meio daquele dia. Foram mais alguma horas juntos e de repente me dei conta que no final do dia a despedida seria mais concreta, e se posso, senti como se uma parede inteira de concreto estivesse sendo erguida nos meus ombros ao me dar conta que existia distância de novo na minha vida.

Um data foi colocada para matarmos a saudade, meses se passaram e aquela semana de amor no verão baiano ganhava um capitulo um pouco mais ameno na terra da garoa. Agora com mais cara de namoro, mais robusto, com algumas centenas de horas conversadas. E mesmo assim numa segunda feira nada amena, tivemos que nos despedir e dessa vez sem uma data de reencontro.

Levou algumas semanas ou meses até chegarmos até uma nova data, data que aparentemente não chega o que me leva a toda redundância e a escolha monotemática das últimas semanas, saudades.

Finalizo esse texto ainda sem saber até onde consigo aguentar a saudade mas nesse momento fecho essa tela e atendo mais uma chamada de vídeo. E assim vamos.

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