No mar tem a gente

É estranha a sensação de estar perto do mar. Ao mesmo tempo que aspiro ansiosamente por estar submerso na sua imensidão, carrego certo desespero de me ver tão insignificante em sua imensidão. 

Gamboa 18.06.2023

Tenho água em minha gênese, ou pelo menos aspectos muito importantes residindo em água. Eu residir muito tempo sobre água mas não muito longe. O árido solo da princesa do sertão está mais próximo do que se imagina.

Ainda me recordo de toda aquela imensidão jorrando por meses numa avenida central da cidade. Litros, milhares ou milhões de litros, jorravam e enxarcavam, asfalto. Aquela água não tocava, temia, sua origem sabia e seu destino não era eu.

Migro!

Me torno residente do litoral. Prometi mil vezes que faria da praia meu quintal, prometi deveras encontros ao mar. O sol me encontrou mais vezes vestidos do que desejaria. Mesmo longe encontrei no mar fuga.

Nunca fui muito do mar, ondas, sal, imensidão descontrolada. Uma força que não compreendo, um poder acima de tudo que posso ser. Muito fui banhado pelas águas doces que escorrem pela chapada dos Diamantes.

Mas percebi que aquelas turvas cobreadas águas eram tão mais perigosas que o azul turquesa que assume o mar em Salvador. A doçura das violentas quedas de água sempre me elevaram para um lugar não aqui.

Já faz algum tempo que não vejo essas águas o que me deixou propenso a buscar no mar de fato e direito conforto. O sal deixou de ser empecilho e virou tempero. A areia, antes incomodo agora adereço da pele que busca no sol vida.

Lançado na praia acompanhado de um pedaço de papel, uma caneta, um lápis. Muitas vezes em pose de uma câmera que vá registrar algo de uma forma que eu queira preservar. Sabe o que acontece quando você começa a observar muito algo?

Você começa a buscar o motivo de tanta observação!

Não muda muita coisa, sabia! As ondas? Continuam lá. A areia da praia? Continua lá. O sol? Esse às vezes não tá muito lá mas continua lá. A gente? Ahhh! Agora sim algo que não continua lá.

A gente vai pro mar mas a gente não volta do mar. Não aquele que entrou, sai outra coisa, outro a gente. Estranho né, não estar perto mas sim está no mar.

Estive no mar depois de muito tempo longe, muito tempo sem sentir o salgar da língua, o esquentar do couro, o puxar das ondas. Palavras bonitas e simplórias metáforas não resumiram quem entrou naquelas águas ontem e quem saiu depois.

Foi um reencontro interessante! Fui levada a uma praia que não visitava há alguns meses, o que tornou esse reencontro um pouco mais desejável. Ao chegar recordei-me da ultima vez que estive ali. Era um belo dia de verão, final de janeiro. Nunca tinha ido tanto a praia como nesse verão.

Foi a primeira vez que estive com ele! De fato o sol estava mais quente, a cidade borbulhava às vésperas de agradecer a mãe do mar e a folia que retornaria. Eu meio que partilhava de ambos anseios mas naquela tarde ansiava pelo encontro de um correspondente distante.

                                      Tem a gente na memoria daquele mar.

Raquel desenhado seu livro novo
Voltei a observar se algo tinha mudado nesses meses além da gente que no caso se tornou a gente depois daqueles mergulhos. Bethânia aniversariava e foi minha companhia, na verdade Raquel também estava lá registrando da forma dela aquele dia de sol.

Comecei a questionar novamente tamanha afeição que essa migração me causou ao mar. Enquanto ria ao ler a inconformação da Letrux ao passar muito tempo longe do mar em certo tempos aí percebi que já estive perto do mar outras vezes. De fato na minha gênese estava muito próximo do mar, assim consideramos Itabuna das praias de Ilhéus.

Mas o fato curioso dessa curiosidade vem da classificação para os nativos de Itabuna que dado pelos sertanejos, significa: aquele que habita o litoral. Enquanto dirigia essa informação Raquel abandonou seus registros para categoricamente lembrar como somos mais leves no mar.

Eu dei um só mergulho!

Voltei para casa com saudades daquele que esta hoje longe do mar. Meu caderno ganhou novos textos. O mar ficou com agora outra versão minha.

Carrego livros, cadernos. Acumulo sal e areia.



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